“O Caminho de Santiago tem algo de diferente que não conseguimos explicar”

Vinte e quatro jovens, cinco animadores leigos, uma religiosa e um padre, ligados aos Missionários da Consolata, fizeram cerca de 200 quilómetros do Caminho de Santiago, de 26 de julho a 6 de agosto. O caminho foi o mesmo para todos, mas o significado desta experiência foi distinto para cada um.

 

Ver o mesmo de forma diferente
Rodrigo Nunes fez o caminho pela segunda vez, e viu tudo de forma diferente. “Já tinha feito o Caminho de Santiago uma vez. Vi exatamente o mesmo caminho que vi da primeira vez. Contudo, acho que o mais maravilhoso foi ver tudo igual e passar pelo caminho de uma forma tão diferente. No primeiro, fiz tudo com moderada facilidade, mas desta vez, um dos meus joelhos fraquejou, o que me levou para o carro de apoio mais do que um dia. Mas foi aqui, depois da deceção inicial, que vi o outro lado da jornada: ir com pressa às compras, reabastecer o carro e cozinhar para os peregrinos. Nos dias em que não andei, fui inevitavelmente desafiado a procurar servir de outra forma. Um serviço mais discreto, mas indispensável para dar força aos peregrinos, e que me fez valorizar o trabalho daqueles que organizaram esta atividade. Vi o mesmo caminho, as mesmas paisagens e os peregrinos dedicados, pisei as mesmas pedras, mas tudo foi muito diferente. Acredito que se fizer exatamente o mesmo trajeto daqui a uns anos vai ser tudo diferente novamente. O trajeto é o mesmo há mais de 1.200 anos, mas o caminho é sempre único pela simples razão de eu ser diferente a cada dia que passa.”

 

Conversas sem pressa
Mariana Leal procurou manter-se consciente da peregrinação ao longo do itinerário, mas isso revelou-se um desafio. “Fui para o Caminho de Santiago sem expetativas. Tentei estar disponível para aceitar o que ele seria, ou não, para mim. Cedo percebi que o meu objetivo era estar presente, antes de iniciar uma nova etapa da minha vida, que está a chegar. Ao longo do caminho, fui descobrindo que estar presente é mais profundo do que desejar que o tempo não passe. Implica reconhecer o espaço e o tempo onde estamos, e, para isso, temos de nos descentrar de nós próprios. Comecei a estar presente quando comecei a contemplar o que estava à minha volta. Quando comecei a deslumbrar-me com cada pessoa que estava a fazer o caminho comigo, com aqueles peregrinos que foram sendo familiares ao longo do percurso, com as paisagens, com os vários momentos de nascer e pôr do sol, e com as conversas que ia tendo, que tinham tempo para existir, sem pressa. O caminho ensinou-me que estar presente é sentirmo-nos profundamente parte daquilo que está à nossa volta e, assim, esquecermo-nos que estamos a viver apenas a partir da nossa perspetiva.”

 

Pausas para mergulhar
Luísa Gaspar recorda com nostalgia as setas amarelas, uma das grandes marcas do percurso. “Levei apenas uma mochila escolar para não carregar coisas supérfluas. Foram dias em que me senti parte do mundo, mas também fora dele. Caminhava 25 quilómetros antes de almoço, e contemplava e refletia sobre o meu próprio caminho. Guardo na memória os passos com leves dores, os nasceres do sol, as bolhas tratadas, as massagens, as setas amarelas a guiar-nos, os mergulhos nos rios e todas as conversas e risos. Fiz este caminho com as pessoas certas e no tempo certo. Percebi que cada dia é o que nós quisermos dar, e que o verdadeiro propósito é aprender a amar.”

 

Dez dias belos e exigentes
Teresa Nunes acredita que o cansaço da jornada levou a um aprofundamento das reflexões. “Para mim, o caminho foi um tempo para olhar a natureza, os peregrinos, o grupo, a Eucaristia e para mim própria. Foi tempo de reflexão, de partilhas, de cansaço físico, de conversas, reencontros, silêncio, de cuidar das lesões, de oração, e de olhar por quem precisa. Foram dez dias exigentes a nível físico e espiritual. Diziam-me que a caminhada se tornava mais fácil após os primeiros dois dias, mas acho que cada dia teve os seus desafios. Fisicamente, o corpo está mais fresco no início, mas vai-se desgastando com o passar do tempo. Porém, mentalmente, acho que ficamos mais atentos às dinâmicas e às reflexões de grupo. Entre os momentos de que mais gostei estão as Eucaristias. Umas aconteceram nos albergues, e os peregrinos que ficavam lá nessas noites também se juntavam. Tivemos Eucaristias em igrejas, mas também num mosteiro e na relva, sempre com animação no final. O Caminho de Santiago tem algo de diferente que não conseguimos explicar. Não é só uma caminhada, não é só uma peregrinação, é um caminho com diversos significados.”

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